Sobre a pena
"Estou condenada", concluiu. E quis lembrar de como tudo começou. Olhou novamente antigas fotos na tentativa de buscar as antigas sensações, mas o esforço foi em vão. Não se pode reproduzir o passado. A raiva, o riso, a tristeza e a alegria de antes - se novamente convocados - já não tem o mesmo sabor, seja ele doce ou amargo. E foi com esta sensação que fechou novamente os álbuns de recordações e tentou se concentrar no presente. Mas tudo que ela conseguia pensar era na crueldade daquela pena. Estava condenada por toda a vida, sem direito a apelação, liberdade condicional, ou redução por bom comportamento. Era prisão perpétua, tortura constante. Àquela altura já não tinha mais muitas certezas sobre o que lhe aconteceria, mas ela sabia que não era a primeira e nem a única a ter tal julgamento. Os que cometeram o mesmo crime, os que ultrapassaram a faixa, tiveram a mesma condenação. Não existiam sectarismos naquele Tribunal. Aquilo a que tinha sido condenada tinha o peso do mundo, poderia gerar vidas ou ocasionar mortes. Despertava as mais variadas reações. Talvez o preço maior da sua pena era exatamente se saber condenada. Na ignorância, apenas era mais uma. Mas a sua conclusão sobre a sentença fazia com que tudo aquilo se tornasse ainda mais difícil do tudo que achava que conseguia suportar. Pensou em formas de fugir, mas viu que era inútil: já que não havia prisões concretas, não poderiam haver subterfúgios. E com pena, se resignou. Entendeu que teria que viver com aquela sentença de amar pelo resto da sua vida. E amou.
