terça-feira, outubro 15, 2002


RSF denuncia cultura da impunidade


Régis Bourgeat (*)

Os jornalistas brasileiros estão pagando caro pelo exercício da liberdade de imprensa. O assassinato de Tim Lopes, da TV Globo, no início de junho de 2002, em um subúrbio do Rio de Janeiro, é uma clara demonstração dessa realidade. Mas esse crime – o assassinato de um jornalista de uma importante rede de televisão, morto por uma organização criminal em uma das maiores cidades do país – não constitui uma imagem representativa da violência da qual a imprensa é tradicionalmente vítima no Brasil.

Na verdade, dos 15 jornalistas assassinados no país desde 1991, a maioria trabalhava para pequenas publicações ou rádios de cidades do interior. Eles pagaram com a vida as revelações que fizeram sobre fraudes cometidas por políticos locais e atos de extorsão praticados por membros da polícia. Contrariamente ao caso de Tim Lopes, em que os assassinos acabaram sendo presos apesar de contarem com a cumplicidade de policiais, quase todos esses crimes permaneceram impunes.

Essa impunidade conduz ao questionamento sobre a organização do poder judiciário no país. Na condição de Federação, o Brasil é regido por uma Constituição que confere amplos poderes aos 26 Estados e ao Distrito Federal que o compõem, em particular na área da Justiça. Assim, o assassinato de um jornalista é da competência exclusiva da justiça dos Estados, mais sensível a pressões locais, e da Polícia Civil, controlada pelos políticos locais.

Só no Estado da Bahia, 10 jornalistas foram assassinados entre 1991 e 1998, na maioria das vezes por razões políticas. Manuel Leal de Oliveira, diretor do jornal semanal A Região, de Itabuna, foi a vítima do mais recente desses crimes. Todos esses delitos continuam, até hoje, impunes.

Com um território pouco maior que o da França, a Bahia continua vivendo, no plano político, sob um regime feudalista anacrônico. Quarto estado brasileiro no ranking econômico, a Bahia atravessou, a partir dos anos 70, além dos problemas nacionais, uma grave crise agrícola. No apogeu dessa crise, Antonio Carlos Magalhães, cacique político onipotente da Bahia e figura dominante da direita brasileira (PFL, Partido da Frente Liberal), consolidou seu poderio pessoal e familiar sobre seu vasto feudo baiano. Foi nesse contexto que Manuel Leal de Oliveira foi assassinado, no dia 14 de janeiro de 1998, em Itabuna, município situado a 450 km ao sul de Salvador.

Os primeiros meses do inquérito, sob a responsabilidade da Polícia Civil da Bahia, constituem um verdadeiro símbolo em matéria de impunidade: uma testemunha foi assassinada, os álibis dos suspeitos foram apenas superficialmente verificados, testemunhas importantes nem sequer foram ouvidas. Em setembro de 1998, o caso Manuel Leal de Oliveira foi "arquivado" pela Justiça de Itabuna, sem que nenhum suspeito tenha sido preso e sem que Fernando Gomes, considerado o principal instigador do crime, tenha prestado depoimento. Prefeito de Itabuna na época, Fernando Gomes é aliado político de Antonio Carlos Magalhães.

fonte: Observatório da Imprensa

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